Matinei ao sábado, com o balanço dos dias úteis. Ainda com um pé na indolência, foi a orelha a puxar-me aos poucos para a realidade. Escutava, em surdina, “aaAAiiii” e um cicio, “aaaaAAAiii” e um cicio. Era um “ai” carregado, à fadista. E a ladainha era repetida vezes sem conta. Soube-me desperto quando disse para comigo: “É sábado. Há praça aqui ao lado”…
Atentei nos rumorejos. Que vinham de uma feirante era ponto assente. Mas gritaria pela cueca bonita ou pela meinha da moda? Pelo queijinho de cabra ou pela chouriça alentejana? Pelo DVD da candonga ou pelo relógio Roldex? Apenas os “ais”, de dinâmica elevada, eram perceptíveis. Seriam estes para atrair clientela ou lamúrias pelo negócio fraco?
Imagino-me esta noite, num bar soturno, acanhado, e fumegante, entre copos e amigos, a ouvir a senhora da praça a cantar Barry White, acompanhada ao piano:
“aaaAAAI’ve heard people say that
aaaaAAAaiiii Too much of anything is not good for you, baby
aaaaaAAAAaaiii oooh nooooo
But aaaaaAAai don't know about that
There's many times that we've loved, ha, ha, haaii
We've shared love and made love
It doesn't seem to me like it's enough, ai
There's just not enough of it
Ai, ai, ai, there's just not enough
Oh, oh, babe, Ooohh, oohh, aaaii, aaii"
Uui! Que bom vai ser acordar tarde amanhã, no silêncio domingueiro.